quarta-feira, junho 04, 2003
Democracia, Sistemas Eleitorais e Capitalismo
Recebi um mail do Pedro Marques que passo a comentar. Começo propositadamente pelo fim.
Não é pelo facto de a China ter aderido ao capitalismo que se transformou numa democracia. Este "adesão" só se verifica, aliás, na chamadas zonas económicas especiais. Os resultados que, nestas, foram alcançados foram notórios, O nível de vida é bastante superior às restantes zonas do país razão pela qual se verifica um fenómeno de emigração em massa para estas
No entanto, a China continua a ter um governo autocrático, repressivo e corrupto. Segundo Francis Fukuyama estes dois fenómenos são incompatíveis e levarão ao colapso deste sistema dual. A liberdade económica requer liberdade política.
A Árabia Saudita também não é uma democracia. Arrisco mesmo a dizer que não é um país capitalista. Grande parte da actividade económica está nas mãos do estado ou da família Saud (o que vai dar no mesmo). Estão-se a esboçar alguns sinais de abertura política mas estes ainda são demasiado ténues e não passaram do campo das intenções.
A Rússia pese embora tenha adoptado algumas instituições democráticas ainda não é comparável ás democracias ocidentais. O estado continua a ser "todo-poderoso" e as estruturas da sociedade civil insignificante. É o resultado de 70 anos do sistema soviético que destruiu tudo o que existia à margem do estado. Como referiu Tocqueville para que a democracia floresça é necessário que surjam os "litlle armies" ie que a sociedade civil seja capaz de se organizar sem intervenção do estado.
Na medida em que o estado continua, em grande parte, todo-poderoso e sem fiscalização é natural que se sinta livre para reprimir todos aqueles que o ameacem.
Para terminar começo pelo início do mail. Diz o Pedro que:
"A tua importação do Americanismo rasca é de facto preocupante. Faz-me lembrar os vibrantes e tocantes discursos do Presidente Bush e comparsas, que afirmam serem os EUA um grande país por serem os líderes do mundo livre e quererem espalhar a democracia pelo mundo todo, no entanto elegem um presidente com menos votos que o candidato alternativo, através de um processo bizarro e pouco transparente de contagem de votos"
Em primeiro lugar gostava que o Pedro me dissesse onde reside o crime em querer exportar a democracia. É infinitamente melhor do que pretender exportar o modelo soviético que tantas tragédias causou.
Quanto aos métodos de eleição garanto são absolutamente transparentes e são os mesmos utilizados há dois séculos. A sua experiência democrática tem maior longevidade que a maior parte dos países do mundo (a única excepção será se não me engano, a Inglaterra).
Pode-se discutir da validade do método eleitoral. Tenho duvidas que a utilização do colégio eleitoral maioritário por estado seja o melhor sistema. No entanto qualquer um dos candidatos podia ter sido beneficiado por ele. Para além disso não nos podemos esquecer que a Administração são bastante fiscalizados que pelo Congresso (um órgão proporcional) que pelo Senado (um órgão paritário). Não existe, como em Portugal, a imposição de sentido de voto pelos partidos. A fidelidade dos eleitos é com os eleitores. Não com as direcções partidárias. Em resumo, numa comparação do sistema político americano com os restantes estes é bastante mais democrático na medida em que existe uma efectiva limitação e fiscalização do poder político.
Quanto aos outros aspectos que o Pedro referiu vou resumir a resposta numa pergunta que lhe devolvo: se os EUA são um país assim tão mau para os seus cidadãos como é que explica que este atraia tantos estrangeiros?
posted by Miguel Noronha 9:51 da manhã
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