sexta-feira, setembro 19, 2003
Os Partidos e a Sociedade
No DN de hoje Manuel Villaverde Cabral passa um quase-atestado de óbito aos partido políticos.
A sua tese baseia-se, principalmente, na "traição" do PT (e de Lula) após vencer as eleições e no recente referendo na Suécia em que os movimentos que apoiaram o "não" foram, não partidos políticos mas, movimentos apartidários.
Antes de mais queria referir que considero os exemplos de MVC faláciosos.
A "traição" de Lula não difere da de outros partidos noutros países que ganham as eleições com base num programa populista (e despesista). A realidade económica não se compadece, no entanto, com as teorias políticas igualitaristas. Perante este axioma só restam duas alternativas ao governo eleito: ou cumpre as suas promessas eleitorais tornando-se responsável pelos seus nefastos efeitos a médio/longo prazo (um bom exemplo desta opção são os governos de António Guterres) ou opta por aceitar a realidade. Não creio que Lula se enquadre perfeitamente no segundo caso embora reconheça que, felizmente para o povo brasileiro, em muitos casos não foi seguida linha da ala mais radical do PT.
Não constituindo a "traição" (como lhe chama MVC) das promessas eleitorais um caso novo esta será julgada pelo eleitores em futuras eleições como sempre sucedeu.
O caso sueco é inteiramente diferente. Nos países escandinavos é comum que nas eleições e referendos referentes à UE a oposição a esta se reuna em movimentos apartidários. O seu objectivo é no entanto uma "single issue" não fazendo sentido a sua transformação em partido político onde os horizontes de intervenção são mais alargados.
De referir que o mesmo sucedeu em Portugal com os recentes (e até agora únicos) referendos acerca da regionalização e do aborto.
A existir um divórcio entre o eleitorado e os partidos políticos (e refiro-me especificamente ao caso português) a razão encontra-se no processo de escolha dos eleitos. A votação em listas distritais em que (na maior parte dos casos) a escolha do cabeça-de-lista é da inteira responsábilidade dos orgãos nacionais do partido ainda para mais com a agravante de estes serem alterados de eleição para eleição é a verdadeira causa. O melhor método para repor a proximidade será a adopção de circulos uninominais.
Nota: Esta opção foi recentemente discutida por vários blogues (entre os quais o Catláxia, o Fumaças, o Faccioso, o Epicurtas e o Veto Político))
Embora não o refira esplicitamente a solução defendida por MVC resido nos chamados novos movimentos sociais (quase todos agupados no FSP). Confesso que me custa a compreender como se pode conferir a estes uma representatividade superior à maioria dos partidos políticos. Como se pode conferir representatividade a organizações cuja aceitação pelos eleitorais não está medido?
A terminar o artigo MVC "remata" com o seguinte parágrafo:
Ora, o défice democrático não só não é exclusivo da União Europeia, como equivale ao declínio do próprio sistema representativo. Em todo o caso, é lícito começar a perguntar se os partidos políticos não serão instituições demasiado arcaicas e grosseiras para representar e gerir sociedades tão complexas como as nossas.
Torna-se claro (para quem andava distraído) que para MVC as sociedades necessitam ser geridas. A sua aposta é claremente num modelo planificado. A solução nomalmente apontada é que os poderes de planificação sejam conferidos a técnicos. Normalmente seres superiores que afastados do "jogo sujo da política" resolveriam todos os problemas da sociedade a regra e esquadro.
A solução que MVC deixa antever não difere muito do modelo da UE que o próprio considera causar um "défice democrático".
A verdadeira solução para este "problema" reside não em mais estado mas na solução inversa. A resolução dos problemas da "complexidade da sociedade" deve ser deixada aos próprios cidadãos que, através das suas escolhas individuais, chegam a melhores resultados que os planificadores.
posted by Miguel Noronha 11:49 da manhã
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