O Intermitente<br> (So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

O Intermitente
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segunda-feira, novembro 24, 2003

Não Pagamos !!!

Do artigo de M. Fátima Bonifácio no Público.

O não às propinas é um tema de eleição para direcções associativas incapazes de mobilisar os estudantes em torno de reivindicações sérias e pertinentes, mas que, exigindo mais estudo, esclarecimento e seriedade, não se prestariam a criar a mesma agitação nem a suscitar a mesma adesão que o mágico "não pagamos" provoca todos os anos. As direcções académicas dependem mais da capacidade de mobilisar a massa estudantil do que da justiça das causas que promovem; dependem mais da capacidade de proporcionar uma grande festa do que da qualidade das análises que produzem. E que maior festa do que concentrarem-se milhares de estudantes a gritar contra o governo ?

As posições do Bloco de Esquerda e de toda a esquerda radical em matéria de propinas já eram conhecidas, e parecem, à primeira vista, de uma impecável coerência. O grau de desenvolvimento económico e social de um país é condicionado pelo nível de educação dos cidadãos. Dantes foi o ensino primário que se generalizou. Depois foi o secundário. Nesta linha de Progresso, exige-se que, na actualidade, se rasgue mais aberto o horizonte educativo para todos. Cada rebento que nasce é potencialmente e teoricamente um candidato à universidade. Esta deverá portanto ser gratuita, quer dizer, paga em exclusivo pelos impostos dos contribuintes, do mesmo modo que já acontece com os cuidados de saúde. E se os impostos não chegam, então que se aumentem. Um estado democrático e social tem a obrigação indeclinável de garantir a gratuidade de todos os graus de ensino. Por que motivo haveriam as famílias, que já pagam impostos, de pagar de novo pela educação dos filhos ? Acaso essa educação não beneficia o país no seu conjunto ? E então não deve ser o país no seu conjunto a pagá-la integralmente ? A isto, que por si só já nos devia convencer da bondade da tese, acresce o facto de que apenas o ensino superior universal e gratuito assegura que não haverá discriminação económica entre os possíveis candidatos.

A tese é falsa, porque assenta em premissas puramente especulativas. É aliás um excelente exemplo daquele "espírito filosófico" que Edmund Burke tanto estranhava e condenava nos raciocínios abstractos dos ideólogos da revolução francesa. Burke referia-se a um tipo de raciocínio que parte de princípios abstractos para daí deduzir como deve ser a realidade e conformar esta com aqueles. Senão vejamos. A ideia de que todos os rebentos que nascem são candidatos potenciais à universidade é simplesmente falsa. Apenas não sabemos, à partida, quais são e quais não - mas sabemos de certeza que nem todos serão. Por muito que custe aos devotos do igualitarismo, as pessoas não nascem todas com a mesma inteligência, talentos e interesses. A grande maior parte delas não possui a capacidade nem desenvolve ao longo da vida a curiosidade intelectual indispensáveis a um estudante com aproveitamento. Aliás, agradecem não serem obrigadas a estudar, o que realmente não faz sentido quando puxar pela cabeça é um sacrifício e ler um livro do princípio ao fim uma tortura. Não vale a pena nem deve ir para a universidade quem se propõe "estudar" pelos apontamentos do parceiro colados à pressa numa noite em branco aguentada a café; nunca deviam lá entrar os alunos que se arrastam anos e anos para concluir, ou não, uma licenciatura paga com os impostos de nós todos. Quer se queira quer não, a universidade é e deverá ser sempre restrita a uma minoria com as competências necessárias para dela aproveitar. A menos que seja de tal modo massificada que o ensino ali ministrado perca toda a especificidade que faz dele um ensino "superior". Infelizmente, graças à "democratização" do ensino, em muitos sítios é o que já se passa.


Nota:
Embora concorde com o essencial deste artigo queria ressalvar que a selectividade deve ser real e não artificial.

Deve competir às Universidades, e não ao Governo, a fixação dos critérios de selecção e do numero de candidatos a admitir por forma a garantir a qualidade do ensino que julga apropriada.

Independentemente de eventuais estudos, realizados pelo ME, para aferir a qualidade dos cursos ministrados o verdadeiro "teste" (não só à qualidade mas também à necessidade de existência ou não de uma dada licenciatura) é o grau de sucesso dos licenciados na obtenção de emprego.
posted by Miguel Noronha 6:05 da tarde

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