terça-feira, novembro 04, 2003
Portugal no seu real lugar
Esta artigo foi publicao no DN de 01/11 (Sábado) mas só hoje consegui aceder à versão online. Constitui uma resposta certeira áqueles que pretendem a continuição das políticas tax and spend levadas a cabo pelos exectuvos de António Guterres.
Os relatórios de organizações internacionais que, com base em indicadores económicos e sociais estabelecem comparações entre países, têm nos últimos tempos evidenciado uma tendência muito clara: depois de termos conseguidos algumas melhorias, no último ano a posição de Portugal deteriorou-se. Esta semana foi o relatório anual do World Economic Forum, que mais uma vez permite uma leitura negativa da evolução do nosso país. Considero, porém, que neste, como em muitos aspectos da vida, nem tudo o que parece é. E que, em vez de apontarmos estes resultados como algo negativo, devíamos compreender que tal é uma consequência natural e inevitável de correcções que tinham absolutamente de ser feitas.
O leitor certamente já passou por situações em que lhe apetecia, por exemplo, comprar uma casa maior, dotá-la de equipamentos de melhor qualidade ou fazer umas espectaculares férias. São desejos que num momento ou noutro fazem parte do sonho de todos nós. Imagine agora o leitor que, não pensando nas consequências a prazo, de repente decidia concretizar esses seus sonhos.
E hoje até é fácil ceder a essa tentação. Pede-se dinheiro emprestado, de início seria fácil encontrar um banco disponível para nos emprestar dinheiro, e em muito curto espaço de tempo estamos a comprar a casa que queríamos, os equipamentos que ambicionávamos ou as férias que também merecemos. A situação seria contudo artificial. Em breve teríamos de cair na realidade.
O crédito fácil esfumar-se-ia, as dívidas acumular-se-iam e rapidamente descobriríamos que nossa vida tinha sido um engano e que teríamos de, por algum tempo, viver pior do que vivíamos antes de ter cedido à tentação.
Com Portugal passou-se mais ou menos o mesmo. Durante alguns anos o governo do país julgou que se poderia gastar acima das nossas reais capacidades. Isso criou margem de manobra para parecermos o que não éramos.
Naturalmente, em muitos indicadores o país melhorou na comparação com os outros. Mas a situação não era sustentável. Rapidamente surgiram desequilíbrios, o mais visível dos quais foi o déficit das contas públicas. Felizmente, compromissos externos impuseram-nos uma disciplina de que não poderíamos facilmente fugir, impedindo que uma situação como a da Argentina se revelasse neste canto da Europa. Ora, no processo de ajustamento que necessariamente se segue, temos de voltar ao nosso verdadeiro e real lugar, caindo algumas posições nos rankings internacionais.
Mas se nesta primeira fase o governo não tinha muita capacidade de manobra, e até devemos estar agradecidos pela coragem que revelou, agora começa o verdadeiro desafio. É preciso construir e mostrar que se é capaz. O país voltou novamente à realidade, cabe agora ao Governo mostrar liderança e conduzir-nos no sentido de um sucesso sustentado.
posted by Miguel Noronha 9:43 da manhã
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