O Intermitente<br> (So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

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sexta-feira, janeiro 23, 2004

A EMENDA E O SONETO


Artigo de Ubiratan Iorio publicado no Jornal do Brasil (link não disponível)

Poucas instituições sociais costumam ser tão atacadas quanto o mercado, embora poucas sejam tão mal compreendidas. Impressiona nos detratores não o fato serem ?contra?, mas o vício grave de deitarem falação sobre algo que, após uma ou duas frases, pode-se perceber com clareza que não conhecem. Opinar sobre o desconhecido não é opinar, é palpitar, papaguear ou tagarelar com objetivos de militância puramente ideológica. Todos têm o direito de criticar o que quer que seja, mas a ética impõe que, antes, o candidato a crítico procure saber o que está censurando, para fundamentar sua opinião e, assim, não incorrer em desonestidade intelectual.

O mercado não é o paraíso e nem o inferno, é apenas um processo dinâmico de descobertas, de interação entre milhões de agentes que, em sua imensa maioria, nem se conhecem, uns vendendo, outros comprando, uns produzindo, outros trabalhando, uns investindo, outros poupando, mas todos atuando da maneira que acham melhor para si, ou seja, agindo sempre na expectativa de passar para estados superiores de satisfação. Por isso, quem compra quer sempre pagar preços menores e quem vende deseja cobrar preços maiores. Esse complexo processo ocorre ininterruptamente e sempre sob quatro condicionantes: (1) o nível de conhecimento dos participantes é incompleto e disperso; (2) por conseguinte, existem incertezas genuínas, não mensuráveis; (3) todos buscam aumentar a sua satisfação; e (4) o tempo é parte importante dele, ao revelar erros, gerar novos conhecimentos e provocar mudanças de expectativas e de ações.

Sob o ponto de vista ético, o mercado não é nem ?bom? nem ?mau?. Pode-se comprar alimentos para bebês ou drogas, vender sorvetes ou favores, emprestar livros ou armas. Cabe à lei fazê-lo funcionar para o bem comum, o que pode ser tentado por dois meios: o intervencionista, em que o Estado o controla e o liberal, em que a intervenção é indireta. Diante de um oligopólio obtido por privilégio legal, por exemplo, os socialistas preferem controlar preços e margens de lucros, ao passo que os liberais sustentam que é melhor expô-lo à competição.

O problema é que só existe uma alternativa ao processo de mercado: o processo político! A questão, então, passa a ser: o que é pior, as falhas do mercado ou as falhas do processo político? Os críticos do primeiro sugerem implicitamente que o segundo é perfeito, ou, pelo menos, superior, o que poderia ser verdadeiro se todos os agentes políticos fossem anjos, ou, pelo menos, mais éticos do que os agentes econômicos. Como todos os gatos são pardos e os atores de ambos os processos buscam aumentar a própria satisfação, a interferência política nos mercados torna-se sempre uma emenda pior do que o soneto, porque impõe custos, ao centralizar decisões, reduzir a eficiência econômica e desestimular a inventividade, o esforço e o mérito, sem adicionar benefícios, ao não eliminar o que os mercados têm de ?mau?. Políticos costumam prometer de acordo com suas esperanças e honrar a palavra de acordo com suas fraquezas...

A maior ilusão do século XX foi a crença de que o processo político seria superior ao de mercado, em termos de melhorar o padrão de vida de um número crescente de pessoas. Foi essa crendice mística que gerou, entre outros monstros, o nazismo, o comunismo, o fascismo e o socialismo, em que a concentração de poder político nas mãos de um grupo ou partido provocou guerras, fuzilamentos de dissidentes, perseguições a minorias e massacres coletivos e fabricou servidão, ódio, inflação, desemprego, escassez, atraso, desigualdade e pobreza, ou, como em todas as experiências socialistas, uma patética igualdade na pobreza, tão ou mais injusta ? porque supressora das liberdades e talentos. individuais - do que a concentração da riqueza.



Relativamente a este artigo gostaria de fazer um comentário ao que é dito no penultimo parágrafo.

Mesmo partindo do pressuposto da santidade dos agentes políticos a sua intervenção no mercado irá sempre perturbar o bom funcionamento dos mesmos.

A Escola Austriaca defende que o sistema de preços relativos actua como farol dos agentes económicos. É a partir da observação dos preços de mercado que os agentes tomam as suas decisões. Este é o ponto de partida e não o de chegada como vulgarmente se julga.

Numa situação em que no mercado não existem se ingerências externas (leia-se políticas) em princípio os agentes irão tomar as decisões de produção,investimento ou consumo que são as mais adequadas (nota: é claro que devido às assimetrias de informação poderão não ser as óptimas).

Uma qualquer acção externa (subsídios, impostos, etc) irá "mexer" no sistema de preços. Dado que nem todos
serão afectadas da mesma forma nem ao mesmo tempo os preços relativos alterar-se-ão levando os agentes a alterar as suas decisões.

Ora como nem todos os Santos possuem o dom da predicção a perturbação que causam no mercado poderá
(será quase certamente) mais nefasta que um suposto "mau funcionamento do mercado".
posted by Miguel Noronha 10:30 da manhã

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