O Intermitente<br> (So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

O Intermitente
(So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

quarta-feira, março 19, 2003

O Swing

Com a devida vénia passo a transcrever um texto do Fernando Magalhães "postado" no Novo Forum Sons. Textos como este merecem ficar preservados para a posteridade.
Para contextualizar os leitores d'O Intermitente refiro que este "post" surgiu no decurso de uma discussão onde se falava da Jacinta. A primeira cantora de Jazz portuguesa a editar pela Blue Note.


O "swing" sente-se. É uma onda. Como as ondas marcam o ritmo do mar, o swing marca o ritmo do músico. Pode tocar-se as notas todas no lugar certo e o swing não estar lá. O "swing" é um balanço interior, não exterior. O "swing" alcança-se quando o músico se abandona à música, a recebe, velha ela e onde vier, sem medo, com alegria, (às vezes com dor). Swing tanto pode estar no jazz mais tradicional como no mais radical. Michel Portal ou Louis Sclavis têm um swing complexo, aparentemente intelectualizado. Sonny Rollins era o swing em pessoa. Modern Jazz Quartet swingam de forma óbvia e ortodoxa. A entrada do saxofone de Sam Rivers no álbum "Dialogue", de Bobby Hutcherson, é o triunfo do swing. John Coltrane, por vezes, esquecia-se de swingar. Miles Davis espalhava swing em seu redor. Ele era o eixo.



Só ouvi 2 temas da Jacinta. O que ouvi (e não estou só nesta opinião), mostrou uma cantora competente e esforçada.

Há discos completamente secantes na Blue Note, "hard bop" a metro, mesmo por alguns monstros sagrados. Assinar para a Blue Note não é garantia de nada, da mesma forma que uma editora contemporânea como a ECM conta no seu catálogo com obras fraquíssimas e completamente inxonsequentes. E vi no rótulo que se trata da "Blue Note" portuguesa, subsidiária do selo intenacional.

Não tenho nada contra a Jacinta, antes pelo contrário.

Como não tenho nada contra a Susanne Abbuehl, outro exemplo que me deixou completamente indiferente, através da audição do álbum "April" editado há uns tempos na ECM. Outro caso de absoluta incapacidade em sentir e fazer passar o "swing". Que a Carla Bley esbanja e de que maneira. Parece aliás, que o concerto da Susanne em Portugal foi uma seca monumental.

Há músicos com fogo, força interior, a sua música até pode ser triste e desolada, mas o fogo está lá. Já uma vez disse e repito: O Músico e o fazedor de música são entidades distintas.

Eu vi e ouvi o primeiro concerto de MICHEL PORTAL, em Sintra, e vi os músicos chorarem em palco, expostos à beleza absoluta da música que faziam. Eu vi e ouvi, em Algés (sempre a tocar de olhos fechados, possuído pelo sagrado) e numa vila qualquer do Norte, a tocar para um público de 6 (seis!) pessoas o VALENTIN CLASTRIER, nesta última ocasião a ajoelhar-se para tocar na sua sanfona electroacústica o som (os sons) de uma catedral.


Não me venham falar da Jacinta e dos Sigur Ros. Há uma escada de Jakob. Infinita. Sobe-se penosamente, degrau a degrau. Há música ao longo de toda ela, entre o céu e os abismos.

O swing é o ritmo da vida feita música. Poucos músicos sabem o que é estar vivo. Poucos músicos sabem (sentem) o que é a Música.

posted by Miguel Noronha 3:41 da tarde

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