O Intermitente<br> (So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

O Intermitente
(So long, farewell, auf weidersehen, good-bye)

quarta-feira, maio 26, 2004

Cunhal

Lembranças de Maria João Avillez.

As pátrias comunistas - Cunhal dizia "socialistas" - eram sempre doiradas e azuis. Era lá que os trabalhadores tinham até "acesso a instalações de recreio que para os portugueses seriam um sonho" e, se havia filas para o talho e para o pão, isso devia-se "às retaliações políticas dos Estados Unidos, cortando a exportação dos cereais". E quando, numa ocasião, a conversa sobre este tema se tornou irrespirável, o Dr. Cunhal começou pura e simplesmente a discorrer sobre as aflições que lhe causavam certas avenidas de Lisboa - na zona do Técnico ou na do Restelo - pejadas, "à luz do dia", de "jovens prostitutas". Como tudo o resto, o muro de Berlim também tinha explicação racional. E nunca se comoveu, ou sequer se interessou, quando um dia lhe descrevi as minhas sombrias vicissitudes ocorridas na mesma Berlim, então ainda "de Leste". A União Soviética era o sal e o sol da terra, e Cuba, terra verdadeiramente "progressista", simbolizava a gloriosa vitória sobre os malefícios americanos, enquanto o pobre, decadente e corrupto Ocidente tinha os dias contados. Sim, assim mesmo, a preto e branco, só a preto e branco, num discurso quase primário, tal o sectarismo de que estava eivado.

posted by Miguel Noronha 2:24 da tarde

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"A society that does not recognize that each individual has values of his own which he is entitled to follow can have no respect for the dignity of the individual and cannot really know freedom."
F.A.Hayek

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